Rui Serra
Voltar ao Centro – a experiência do atelier no processo criativo
O atelier materializa o ‘espaço mental’ que o artista ocupa sempre que pensa Pintura. Pode ser visto como um espaço onde o autor surge na condição de entidade que permite o adequado nascimento de novas obras. Nesse sentido, a actividade artística, e toda a cosmovisão vivida dentro do atelier, são uma realidade à parte, são a dimensão e o lugar onde a espiritualidade do pintor é colocada em jogo.
Por sua vez, é comum pensar-se que o processo de pintura em atelier tem algo de misterioso e que o autor, por não falar sobre o mesmo, está a esconder um segredo que não deseja ser revelado. Demonstrar-se-á nesta investigação que a revelação desse processo - os mecanismos de recolha, apropriação e concretização, a parte oculta da actividade artística caracterizada pelos trajectos erráticos, pelas escolhas, pelas indecisões, pelos enganos e trabalho perdido - pouco ou nada têm a ver com a dimensão de mistério identificada na criação pura. Portanto, esta linha de investigação servirá também para desmistificar a suposta dimensão oculta da actividade artística.
Por último, pensar-se-á o atelier como um espaço de meditação, de contemplação e de introspecção, ou seja, como centro ou espaço vital (interior, abrigado, protegido) onde o cosmos nasce do caos. Assim, e do ponto de vista mítico-simbólico, pensar-se-á o atelier como uma ‘caverna matriz’, como espaço sagrado onde o artista repete esse acto primordial que é ‘dar à luz’ uma nova vida.
(16.1.2015)